quinta-feira, 28 de abril de 2011

Educadores contestam artigo da "Veja"


Sob o título "Que bom que os Sindicatos de Trabalhadores da Educação preocupam os sacerdotes da privataria e seus braços ideológicos!", vários educadores divulgaram texto com críticas ao artigo de Gustavo Ioschpe ("Hora de Peitar os Sindicatos de Professores"), veiculado no site da revista "Veja".
Por Gaudêncio Frigotto, Zacarias Gama, Eveline Algebaile, Vânia Cardoso da Mota e Hélder Molina
Vários meios de comunicação utilizam-se de seu poder unilateral para realizar ataques truculentos a quem ousa contrariar seus interesses. O artigo de Gustavo Ioschpe, publicado na edição de 12 de abril de 2011 da Revista Veja (campeã disparada do pensamento ultraconservador no Brasil), não apenas confirma a opção deliberada da Revista em atuar como agência de desinformação – trafegando interesses privados mal disfarçados de interesse de todos –, como mostra o exercício dessa opção pela sua mais degradada face, cujo nível, deploravelmente baixo, começa pelo título – "hora de peitar os sindicatos". Com a arrogância que o caracteriza como aprendiz de escriba, desde o início de seu texto, o autor considera patrulha ideológica qualquer discordância em relação às suas parvoíces.
Na década de 1960, Pier Paolo Pasolini escrevia que o fascismo arranhou a Itália, mas o monopólio da mídia a arruinou. Cinquenta anos depois, a história lhe deu inteira razão. O mesmo poderia ser dito a respeito das ditaduras e reiterados golpes que violentaram vidas, saquearam o Brasil, enquanto o monopólio privado da mídia o arruinava e o arruína. Com efeito, os barões da mídia, ao mesmo tempo em que esbravejam pela liberdade de imprensa, usam todo o seu poder para impedir qualquer medida de regulação que contrarie seus interesses, como no caso exemplar da sua oposição à regulamentação da profissão de jornalista. Os áulicos e acólitos dessa corte fazem-lhe coro.
O que trafega nessa grande mídia, no mais das vezes, são artigos de prepostos da privataria, cheios de clichês adornados de cientificismo para desqualificar, criminalizar e jogar a sociedade contra os movimentos sociais defensores dos direitos que lhes são usurpados, especialmente contra os sindicatos que, num contexto de relações de superexploração e intensificação do trabalho, lutam para resguardar minimamente os interesses dos trabalhadores.
Os artigos do senhor Gustavo Ioschpe costumam ser exemplos constrangedores dessa "vocação". Os argumentos que utiliza no artigo recentemente publicado impressionam, seja pela tamanha tacanhez e analfabetismo cívico e social, seja pelo descomunal cinismo diante de uma categoria com os maiores índices de doenças provenientes da superintensificação das condições precárias de trabalho às quais se submete.
Um dos argumentos fundamentais de Ioschpe é explicitado na seguinte afirmação:
Cada vez mais a pesquisa demonstra que aquilo que é bom para o aluno na verdade faz com que o professor tenha que trabalhar mais, passar mais dever de casa, mais testes, ocupar de forma mais criativa o tempo de sala de aula, aprofundar-se no assunto que leciona. E aquilo que é bom para o professor – aulas mais curtas, maior salário, mais férias, maior estabilidade no emprego para montar seu plano de aula e faltar ao trabalho quando for necessário - é irrelevante ou até maléfico aos alunos.
A partir desse raciocínio de lógica formal, feito às canhas, tira duas conclusões bizarras. A primeira refere-se à atribuição do poder dos sindicatos ao seu suposto conflito de interesses com "a sociedade representada por seus filhos/alunos": "É por haver esse potencial conflito de interesses entre a sociedade representada por seus filhos/alunos e os professores e funcionários da educação que o papel do sindicato vem ganhando importância e que os sindicatos são tão ativos (...)".
A segunda, linearmente vinculada à anterior, tenta estabelecer a existência de uma nefasta influência dos sindicatos sobre o desempenho dos alunos. Nesse caso, apoia-se em pesquisa do alemão Ludger Wossmann, fazendo um empobrecido recorte das suas conclusões, de modo a lhe permitir afirmar que "naquelas escolas em que os sindicatos têm forte impacto na determinação do currículo os alunos têm desempenho significativamente pior".
Os signatários deste breve texto analisam, há mais de dois anos, a agenda de trabalho de quarenta e duas entidades sindicais afiladas à Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE) e acompanham ou atuam como afiliados nas ações do Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições de Ensino Superior - ANDES-SN. O que extraímos dessas agendas de ação dos sindicatos é, em tudo, contrário às delirantes e deletérias conclusões do articulista.
Em vez de citar pesquisas de segunda mão, para mostrar erudição e cientificidade em seu argumento, deveria apreender o que demanda uma análise efetivamente científica da realidade. Isso implicaria que de fato pesquisasse sobre a ação sindical docente e sobre os processos econômico-sociais e as políticas públicas com os quais se confronta e dialoga e, a partir dos quais, se constitui. Não imaginamos que um filho de banqueiros ignore que os bancos, os industriais, os latifundiários, a grande mídia têm suas federações ou organizações que fazem lobbies para ter as benesses do fundo público.
Um efetivo envolvimento com as pesquisas e com os processos sociais permitiria ao autor perceber onde se situam os verdadeiros antagonismos e "descobrir" que os sindicatos não se criaram puxando-se de um atoleiro pelos cabelos – à moda do Barão de Münchhausen –, autoinventando-se, muito menos confrontando-se com os alunos e seus pais.
As análises que não levam isso em conta, que se inventam puxando-se pelos cabelos a partir dos atoleiros dos próprios interesses, não conseguem apreender minimamente os sentidos dessa realidade e resultam na sequência constrangedora de banalidades e de afirmações levianas como as expostas por Ioschpe.
Uma das mais gritantes é relativa ao entendimento do autor sobre quem representa a sociedade no processo educativo. É forçoso lembrar ao douto analista que os professores, a direção da escola e os sindicatos também pertencem à sociedade e não são filhos de banqueiros nem se locupletam com vantagens provenientes dos donos do poder.
Ademais, valeria ao articulista inscrever-se num curso de história social, política e econômica para aprender uma elementar lição: o sindicato faz parte do que define a legalidade formal de uma sociedade capitalista, mas o ultraconservadorismo da revista na qual escreve e com a qual se identifica já não o reconhece, em tempos de vingança do capital contra os trabalhadores.
Cabe ressaltar que todos os trocadilhos e as afirmações enfáticas produzidos pelo articulista não conseguem encobrir os interesses privados que defende e que afetam destrutivamente o sentido e o direito da população à educação básica pública, universal, gratuita, laica e unitária.
Ao contrário do que afirma a respeito da influência dos sindicatos nos currículos, o que está mediocrizando a educação básica pública é a ingerência de institutos privados, bancos e financistas do agronegócio, que infestam os conteúdos escolares com cartilhas que empobrecem o processo de formação humana, impregnando-o com o discurso único do mercado – o da educação de empreendedores. E que, muitas vezes, com a anuência de grande parte das administrações públicas, retiram do professor a autoridade e a autonomia sobre o que ensinar e como ensinar dentro do projeto pedagógico que, por direito, eles constroem, coletivamente, a partir de sua realidade.
O que o Sr. Ioschpe não mostra, descaradamente, é que esses institutos privados não buscam a educação pública de qualidade e nem atender o interesse dos pais e alunos, mas lucrar com a venda de pacotes de ensino, de metodologias pasteurizadas e de assessorias.
Por fim, é de um cinismo e desfaçatez vergonhosa a caricatura que o articulista faz da luta docente por condições de trabalho e salário dignos. Caberia perguntar se o douto senhor estaria tranquilo com um salário-base de R$ 1.487,97, por quarenta horas semanais, para lecionar em até 10 turmas de cinquenta jovens. O desafio é: em vez de "peitar os sindicatos", convide a sua turma para trabalhar 40 horas e acumular essa "fortuna" de salário básico. Ou, se preferir fazer um pouco mais, trabalhar em três turnos e em escolas diferentes. Provavelmente, esse piso para os docentes tem um valor bem menor que o que recebe o articulista para desqualificar e criminalizar, irresponsavelmente, uma instituição social que representa a maior parcela de trabalhadores no mundo.
Mas a preocupação do articulista e da revista que o acolhe pode ir aumentando, porque, quando o cinismo e a desfaçatez vão além da conta, ajudam aqueles que ainda não estão sindicalizados a entender que devem fazê-lo o mais rápido possível.
Gaudêncio Frigotto, Zacarias Gama e Eveline Algebaile são professores do Programa de Pós-Graduação em Políticas Públicas e Formação Humana da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (PPFH/UERJ).
Vânia Cardoso da Mota é Professora da Faculdade de Educação da Universidade Federal do Rio de Janeiro e Colaboradora do PPFH/UERJ.
Hélder Molina é educador, assessor sindical e doutorando do PPFH/UERJ.

FonteCaros Amigos


Leia materia completa: Educadores contestam artigo da "Veja" - Portal Geledés 

quarta-feira, 20 de abril de 2011

Por que da páscoa?

Queres aprender sobre a Páscoa? Sabes que é uma data tão ou mais importante que o Natal?


Ovos e coelhos,porquê?


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É um costume com origem pagã, em que os ovos estão associados ao início da vida e os coelhos à fertilidade. Os ovos são oferecidos desde sempre, mas no início eram ovos verdadeiros, decorados com tintas ou até por jóias verdadeiras. Por exemplo, na China, eram cozidos com beterraba para lhes tingir a casaca. Só no séc. XVIII é que apareceram os de chocolate, criados por confeiteiros franceses. Os ovos mais famosos do mundo são os do joalheiro Fabergé, que os fazia para os czares (na Rússia).

 E porque não há data fixa?
Porque a Páscoa, associada ao início da Primavera (nas celebrações pagãs), acontece no primeiro domingo depois da primeira Lua Cheia da Primavera.
Celebras a Ressurreição de Jesus Cristo, isto na religião cristã.
O facto de se entrar na Primavera, era um motivo de celebração nas tradições pagãs, onde faziam homenagens aos deuses.

A Páscoa deve ser um momento para se viver em família.


 Origem da Páscoa


A origem desta comemoração vem de há muitos séculos atrás. Em latim dizia-se Pascae e na Grécia Antiga Paska. Mas a sua origem mais antiga é entre os hebreus, onde aparece a palavra Pesach, cujo significado é passagem.



 E porque é que se celebra a Páscoa?


Entre os primeiros cristãos, esta data celebrava a Ressurreição de Jesus Cristo (quando, após a morte, voltou à vida).
A semana anterior à Páscoa é considerada como Semana Santa. Tem início no Domingo de Ramos que marca a entrada de Jesus na cidade de Jerusalém. 

Texto original:giggle - smile

segunda-feira, 18 de abril de 2011

Repensando o Dia do Índio (19 de abril)

10 passos para o ensino da história indígena

Entenda a lei 11 645 e veja o que a escola do seu filho tem feito dentro e fora das salas de aula para cumpri-la

Educar

13/04/2011 13:59

Texto
Mariana Queen 
Foto: Carlos Goldgrub

Educadores consideram importante a valorização da diversidade cultural no Brasil, onde os indígenas correspondem a aproximadamente 0,5% da população

Se você ainda acha que o Brasil foi descoberto em 1500, precisa rever seus conceitos. A história e a cultura deste pedaço de terra à leste de Tordesilhas começou bem antes da chegada das naus portuguesas. E é esta consciência de que o Brasil é anterior a Pedro Álvares Cabral que a escola precisa discutir. É o que prevê a lei 11 645 , que obriga o estudo da história e cultura indígenas em todas as escolas nacionais de Ensino Fundamental e Médio, desde 2008.

lei 11.645 acrescentou a obrigatoriedade do ensino da cultura e história indígena à lei 10.639, de 2003, responsável por inserir a história afro-brasileira e africana nos currículos escolares. A intenção é fazer com que as questõesindígenas e afro-brasileiras sejam abordadas em disciplinas como Educação Artística, Literatura e, claro, História do Brasil.

Sabendo da existência e da importância da lei 11.645, vale ficar de olho no que as instituições de ensino estão fazendo para cumpri-la. Veja abaixo o que a escola do seu filho pode fazer para abordar o conteúdo nas salas de aula e como você, pai, pode contribuir com o processo.

Texto retirado do site:

                                                               http://educarparacrescer.abril.com.

18 de abril : 129º Aniversário de Monteiro Lobato,

MONTEIRO LOBATO
Escritor: 1882 - 1948


(*) - Fanny Abramovich é escritora de livros para crianças e só gostaria de proporcionar aos seus leitores 10% do prazer que Lobato sempre lhe deu.

Monteiro Lobato, retrato
SÍTIO DO PICAPAU AMARELO: O REFÚGIO SONHADO POR TODAS AS CRIANÇAS
QUANDO TUDO ACONTECEU...
O maior escritor infantil brasileiro de todos os tempos, José Bento Monteiro Lobato, nasceu em 18 de abril de1882, em Taubaté (SP). Cresceu numa fazenda, se formou em direito sem nenhum entusiasmo, já que sempre quis ser pintor! Desenhava bem! Quando estudante, participou do grupo "O Cenáculo" e entre risadas e leituras insaciáveis, escreveu crônicas e artigos irreverentes. - Em 1907 foi para Areias como promotor público, casou com Maria Pureza com quem teve três filhos. Entediado com a vida numa cidade pequena, escreveu prefácios, fez traduções, mudou para a fazenda Buquira, tentou modernizar a lavoura arcaica, criou o polêmico "Jeca Tatu", fez uma imensa e acalentada pesquisa sobre o SACI publicada no Jornal O Estado de São Paulo. - Em 1918 lançou, com sucesso, seu primeiro livro de contos URUPÊS. Fundou a Editora Monteiro Lobato & Cia, melhorando a qualidade gráfica vigente, lançando autores inéditos e chegando à falência. - Em 1920 lançou A MENINA DO NARIZ ARREBITADO, com desenhos e capa de Voltolino, conseguindo sua adoção em escolas e uma edição recorde de 50.000 exemplares. - Fundou a Cia Editora Nacional no Rio de Janeiro. Convidado pra ser adido comercial em New York ficou lá por 4 anos (de 1927 a1931) fascinado por Henry Ford, pela metalurgia e petróleo. Perdeu todo seu dinheiro no crash da bolsa. - Voltou para o Brasil, se jogou na Campanha do Petróleo, fazendo conferências, enviando cartas, conscientizando o país inteiro da importância do óleo. Percebeu, então, o quanto era conhecido e popular. Foi preso! Alternou entusiasmo e depressão com o Brasil. - Participou da Editora Brasiliense, morou em Buenos Aires, foi simpatizante comunista, escreveu para crianças ininterruptamente e com sucesso estrondoso, traduziu muito e teve suas obras traduzidas. - Morreu em 4 de julho de 1948 dum acidente vascular. - Suas obras completas são constituídas por 17 volumes dirigidos às crianças e 17 para adultos englobando contos, ensaios, artigos e correspondência.


Texto retirado do site: http://www.vidaslusofonas.pt/monteiro_lobato.htm

sexta-feira, 15 de abril de 2011

Gravadora Sony que foi condenada a pagar indenização por música

Não perca o próximo encontro do Ponto de Cultura Criola. Fique sabendo qual foi a repercussão do caso da gravadora Sony que foi condenada a pagar indenização por música considerada racista em CD de Tiririca.

O processo, iniciado em 1997, tinha como alvo a canção " Veja os Cabelos Dela", composta pelo próprio Tiririca e que dizia: "Parece bom-bril, de ariá panela / Eu já mandei, ela se lavar / Mas ela teimo, e não quis me escutar / Essa nega fede, fede de lascar / Bicha fedorenta, fede mais que gambá".
Aproveite para refletir e dar sua opinião sobre esse e outros temas que serão discutidos pelas mulheres negras, por profissionais da comunicação e da mídia.

Tema: Mídia, Cultura e Racismo: representações sobre a mulher negra
Quando: 18 de abril de 2011 (segunda) Horário: 18 horas
Onde: ABPV - Avenida Presidente Vargas 482, sobreloja 205 - auditório ao lado da ONG Criola(entrada pela Rua Miguel Couto 105)
Convidadas: Adriana Batista e Liv Sovik
Informações com Marmo e Luceni no criola@criola.org.br ou no (21) 2518-6194
Versão retirada do site Carta Maior: 
http://www.cartamaior.com.br/templates/colunaMostrar.cfm?coluna_id=4967&boletim_id=836&componente_id=13728
Carta aberta ao Ziraldo 


Peguei-o para bode expiatório, Ziraldo? Sim, sempre tem que ter algum. E, sem ódio,
espero que você não queira que eu morra por te criticar. Você disse que "os
americanos odeiam os negros, mas aqui nunca houve uma organização como a Ku
Klux Klan". Se dependesse de Monteiro Lobato, o Brasil teria tido sua Ku-Klux-Klan,
Ziraldo.
Data: 19/02/2011
Publicado originalmente no Biscoito Fino e a Massa
Caro Ziraldo,
Olho a triste figura de Monteiro Lobato abraçado a uma mulata, estampada nas camisetas
do bloco carnavalesco carioca "Que merda é essa?" e vejo que foi obra sua. Fiquei curiosa
para saber se você conhece a opinião de Lobato sobre os mestiços brasileiros e, de verdade,
queria que não. Eu te respeitava, Ziraldo. Esperava que fosse o seu senso de humor falando
mais alto do que a ignorância dos fatos,  e por breves momentos até me senti vingada.
Vingada contra o racismo do eugenista Monteiro Lobato que, em carta ao amigo Godofredo
Rangel, desabafou: "(...)Dizem que a mestiçagem liquefaz essa cristalização racial que é o
caráter e dá uns produtos instáveis. Isso no moral – e no físico, que feiúra! Num desfile, à
tarde, pela horrível Rua Marechal Floriano, da gente que volta para os subúrbios, que
perpassam todas as degenerescências, todas as formas e má-formas humanas – todas,
menos a normal. Os negros da África, caçados a tiro e trazidos à força para a escravidão,
vingaram-se do português de maneira mais  terrível – amulatando-o e liquefazendo-o,
dando aquela coisa residual que vem dos subúrbios pela manhã e reflui para os subúrbios
à tarde. E vão apinhados como sardinhas e há um desastre por dia, metade não tem braço
ou não tem perna, ou falta-lhes um dedo, ou mostram uma terrível cicatriz na cara. “Que
foi?” “Desastre na Central.” Como consertar essa gente? Como sermos gente, no
concerto dos povos? Que problema terríveis  o pobre negro da África  nos criou aqui, na
sua inconsciente vingança!..." (em "A barca de Gleyre". São Paulo: Cia. Editora Nacional,
1944. p.133).
Ironia das ironias, Ziraldo, o nome do livro de onde foi tirado o trecho acima é inspirado
em um quadro do pintor suíço Charles Gleyre (1808-1874), Ilusões Perdidas. Porque foi
isso que aconteceu. Porque lendo uma matéria  sobre o bloco e a sua participação, você
assim o  endossa :  "Para acabar com a polêmica, coloquei o Monteiro Lobato sambando
com uma mulata. Ele tem um conto sobre  uma neguinha que é uma maravilha. Racismo
tem ódio. Racismo sem ódio não é racismo. A ideia é acabar com essa brincadeira de achar que a gente é racista". A gente quem, Ziraldo? Para quem você se (auto) justifica?
Quem te disse que racismo sem ódio, mesmo aquele com o "humor negro" de unir uma
mulata a quem grande ódio teve por ela e  pelo que ela representava, não é racismo?
Monteiro Lobato, sempre que se referiu a negros e mulatos, foi com ódio, com desprezo,
com a certeza absoluta da própria superioridade, fazendo uso do dom que lhe foi dado e
pelo qual é admirado e defendido até hoje. Em uma das cartas que iam e vinham na barca
de Gleyre (nem todas estão publicadas no livro, pois a seleção foi feita por Lobato, que as
censurou, claro) com seu amigo Godofredo Rangel, Lobato confessou que sabia que a
escrita "é um processo indireto de fazer eugenia, e os processos indiretos, no Brasil, 'work'
muito mais eficientemente".
Lobato estava certo. Certíssimo. Até hoje, muitos dos que o leram não veem nada de errado
em seu processo de chamar negro de burro aqui, de fedorento ali, de macaco acolá, de
urubu mais além. Porque os processos indiretos, ou seja, sem ódio, fazendo-se passar por
gente boa e amiga das crianças e do Brasil, "work" muito bem. Lobato ficou frustradíssimo
quando seu "processo" sem ódio, só na inteligência, não funcionou com os norteamericanos, quando ele tentou em vão encontrar editora que publicasse o que considerava
ser sua obra prima em favor  da eugenia e da eliminação, via esterilização, de todos os
negros. Ele falava do livro "O presidente negro ou O choque das raças" que, ao contrário do
que aconteceu nos Estados Unidos, país daquele povo que odeia negros, como você diz,
Ziraldo, foi publicado no Brasil. Primeiro em capítulos no jornal carioca A Manhã, do qual
Lobato era colaborador, e logo em seguida em edição da Editora Companhia Nacional,
pertencente a Lobato. Tal livro foi dedicado secretamente ao amigo e  médico eugenista
Renato Kehl, em meio à vasta e duradoura correspondência trocada pelos dois: “Renato, tu
és o pai da eugenia no Brasil e a ti devia eu dedicar meu Choque, grito de guerra pró-
eugenia. Vejo que errei não te pondo lá no frontispício, mas perdoai a este estropeado
amigo. (...) Precisamos lançar, vulgarizar estas idéias. A humanidade precisa de uma coisa
só: póda. É como a vinha".
Impossibilitado de colher os frutos dessa poda nos EUA, Lobato desabafou com Godofredo
Rangel:  "Meu romance não encontra editor. [...]. Acham-no ofensivo à dignidade
americana, visto admitir que depois de tantos séculos de progresso moral possa este povo,
coletivamente, cometer a sangue frio o belo crime que sugeri. Errei vindo cá tão verde.
Devia ter vindo no tempo em que eles linchavam os negros." Tempos depois, voltou a se
animar: "Um escândalo literário equivale no mínimo a 2.000.000 dólares para o autor (...)
Esse ovo de escândalo foi recusado por cinco editores conservadores e amigos de obras
bem comportadas, mas acaba de encher de entusiasmo um editor judeu que quer que eu o
refaça e ponha mais matéria de exasperação. Penso como ele e estou com idéias de
enxertar um capítulo no qual conte a guerra donde resultou a conquista pelos Estados
Unidos do México e toda essa infecção spanish da América Central. O meu judeu acha que
com isso até uma proibição policial obteremos - o que vale um milhão de dólares. Um livro
proibido aqui sai na Inglaterra e entra boothegued como o whisky e outras implicâncias
dos puritanos". Lobato percebeu, Ziraldo, que talvez devesse apenas exasperar-se mais, ser
mais claro em suas ideias, explicar melhor seu ódio e seu racismo, não importando a quem
atingiria e nem por quanto tempo perduraria, e nem o quão fundo se instalaria na sociedade
brasileira. Importava o dinheiro, não a exasperação dos ofendidos. 2.000.000 de dólares, ele pensava, por um ovo de escândalo. Como também foi por dinheiro que o Jeca Tatu,
reabilitado, estampou as propagandas do Biotônico Fontoura.
Você sabe que isso dá dinheiro, Ziraldo, mesmo que o investimento tenha sido a longo
prazo, como ironiza Ivan Lessa:  "Ziraldo, o guerrilheiro do traço, está de parabéns.
Finalmente o governo brasileiro tomou vergonha na cara e acabou de pagar o que devia
pelo passe de Jeremias, o Bom, imortal  personagem criado por aquele que também é
conhecido como “o Lamarca do nanquim”. Depois do imenso sucesso do calunguinha nas
páginas de diversas publicações, assim como também na venda de diversos produtos
farmacêuticos, principalmente doenças da tireóide, nos idos de 70, Ziraldo, cognominado
ainda nos meios esclarecidos como “o subversivo da caneta Pilot”, houve por bem (como
Brutus, Ziraldo é um homem de bem; são todos uns homens de bem – e de bens também)
vender a imagem de Jeremias para a loteca, ou seja, para a Caixa Econômica Federal
(federal como em República Federativa do Brasil) durante o governo Médici ou Geisel (os
déspotas esclarecidos em muito se assemelham, sendo por isso mesmo intercambiáveis)".
No tempo em que linchavam negros, disse Lobato, como se o linchamento ainda não fosse
desse nosso tempo. Lincham-se negros nas ruas, nas portas dos shoppings e bancos, nas
escolas de todos os níveis de ensino, inclusive o superior. O que é até irônico, porque
Lobato nunca poderia imaginar que chegariam lá. Lincham-se negros, sem violência física,
é claro, sem ódio, nos livros, nos artigos de jornais e revistas, nos cartoons e nas redes
sociais, há muitos e muitos carnavais. Racismo não nasce do ódio ou amor, Ziraldo, sendo
talvez a causa e não a consequência da presença daquele ou da ausência desse. Racismo
nasce da relação de poder. De poder ter influência ou gerência sobre as vidas de quem é
considerado inferior.  "Em que estado voltaremos, Rangel," se pergunta Lobato, ao se
lembrar do quadro para justificar a escolha do nome do livro de cartas trocadas,  "desta
nossa aventura de arte pelos mares da vida em fora? Como o velho de Gleyre? Cansados,
rotos? As ilusões daquele homem eram as velas da barca – e não ficou nenhuma. Nossos
dois barquinhos estão hoje cheios de velas novas e arrogantes, atadas ao mastro da nossa
petulância. São as nossas ilusões". Ah, Ziraldo, quanta ilusão (ou seria petulância?
arrogância; talvez? sensação de poder?) achar que impor à mulata a presença de Lobato
nessa festa tipicamente negra, vá acabar com a polêmica e todos poderemos soltar as ancas
e cada um que sambe como sabe e pode. Sem censura. Ou com censura, como querem os
quemerdenses. Mesmo que nesse do  Caçadas de Pedrinho a palavra censura não
corresponda à verdade, servindo  como mero pretexto para manifestação de discordância
política, sem se importar com a carnavalização de um tema tão dolorido e tão caro a
milhares de brasileiros. E o  que torna tudo ainda mais apelativo é que o bloco aponta
censura onde não existe e se submete, calado, ao pedido da prefeitura para que não use o
próprio nome no desfile. Não foi assim? Você não teve que escrever "M*" porque a palavra
"merda" foi censurada? Como é que se explica isso, Ziraldo? Mente-se e cala-se quando
convém? Coerência é uma questão de caráter.
O que o MEC solicita não é censura. É respeito aos Direitos Humanos. Ao direito de uma
criança negra em uma sala de aula do ensino básico e público, não se ver representada (sim,
porque os processos indiretos, como  Lobato nos ensinou, "work" muito mais
eficientemente) em personagens chamados de macacos, fedidos, burros, feios e outras indiretas mais. Você conhece os direitos humanos, inclusive foi o artista escolhido para
ilustrar a Cartilha de Direitos Humanos encomendada pela Presidência da República, pelas
secretarias Especial de Direitos Humanos e de Promoção dos Direitos Humanos, pela ONU,
a UNESCO, pelo MEC e por vários outros órgãos. Muitos dos quais você agora desrespeita
ao querer, com a sua ilustração, acabar de vez com a polêmica causada por gente que
estudou e trabalhou com seriedade as questões de educação e desigualdade racial no Brasil.
A adoção do  Caçadas de Pedrinho vai contra a lei de Igualdade Racial e o Estatuto da
Criança e do Adolescente, que você conhece  e ilustrou tão bem. Na página 25 da sua
Cartilha de Direitos  Humanos, está escrito:  "O único jeito de uma sociedade melhorar é
caprichar nas suas crianças. Por isso, crianças e adolescentes têm prioridade em tudo que
a sociedade faz para garantir os direitos humanos. Devem ser colocados a salvo de tudo
que é violência e abuso. É como se os direitos humanos formassem um ninho para as
crianças crescerem." Está lá, Ziraldo, leia de novo: "crianças e adolescentes têm
prioridade". Em tudo. Principalmente em situações nas quais são desrespeitadas, como na
leitura de um livro com passagens racistas, escrito por um escritor racista com finalidades
racistas. Mas você não vê racismo e chama de patrulhamento do politicamente correto e
censura. Você está pensando nas crianças, Ziraldo? Ou com medo de que, se a moda pega,
a "censura" chegue ao seu direito de continuar brincando  com o assunto? "Acho injusto
fazer isso com uma figura da grandeza de Lobato", você disse em uma reportagem. E com
as crianças, o público-alvo que você divide  com Lobato, você acha justo? Sim, vocês
dividem o mesmo público e, inclusive, alguns personagens, como uma boneca e pano e o
Saci, da sua Turma do Pererê. Medo de censura, Ziraldo, talvez aos deslizes, chamemos
assim, que podem ser cometidos apenas porque se acostuma a eles, a ponto de pensar que
não são, de novo chamemos assim, deslizes.
A gente se acostuma, Ziraldo. Como o seu menino marrom se acostumou com as sandálias
de dedo: "O menino marrom estava tão acostumado com aquelas sandálias que era capaz
de jogar futebol com elas, apostar corridas, saltar obstáculos sem que as sandálias
desgrudassem de seus pés. Vai ver, elas já faziam parte dele" (ZIRALDO, 1986,p. 06, em O
Menino Marrom). O menino marrom, embora seja a figura simpática e esperta e bonita que
você descreve, estava acostumado e fadado a  ser pé-de-chinelo, em comparação ao seu
amigo menino cor-de-rosa, porque  "(...) um já está quase formado e o outro não estuda
mais (...). Um já conseguiu um emprego, o  outro foi despedido do  quinto que conseguiu.
Um passa seus dias lendo (...), um não lê  coisa alguma, deixa tudo  pra depois (...). Um
pode ser diplomata ou chofer de caminhão. O outro vai ser poeta ou viver na contramão
(...). Um adora um som moderno e o outro – Como é que pode? – se amarra é num pagode.
(...) Um é um cara ótimo e o outro, sem qualquer duvida, é um sujeito muito bom. Um já
não é mais rosado e o outro está  mais marrom" (ZIRALDO, 1986, p.31). O menino
marrom, ao crescer, talvez virasse marginal, fado de muito negro, como você nos mostra
aqui:  "(...) o menino cor-de-rosa resolveu perguntar: por que você vem todo o dia ver a
velhinha atravessar a rua? E o menino marrom respondeu: Eu quero ver ela ser
atropelada" (ZIRALDO, 1986, p.24), porque a própria professora tinha ensinado para ele a
diferença e a (não) mistura das cores. Então ele pensou que  "Ficar sozinho, às vezes, é
bom: você começa a refletir, a pensar muito e consegue descobrir coisas lindas. Nessa de
saber de cor e de luz (...) o menino marrom começou a entender porque é que o branco
dava uma idéia de paz, de pureza e de alegria. E porque razão o preto simbolizava a
angústia, a solidão, a tristeza.  Ele pensava: o preto é a escuridão, o olho fechado; você não vê nada. O branco é o olho aberto, é a luz!" (ZIRALDO, 1986, p.29), e que deveria se
conformar com isso e não se revoltar, não ter ódio nenhum ao ser ensinado que, daquela
beleza, pureza e alegria que havia na cor branca, ele não tinha nada. O seu texto nos ensina
que é assim, sem ódio, que se doma e se educa para que cada um saiba o seu lugar, com
docilidade e resignação:  "Meu querido amigo: Eu andava muito triste ultimamente, pois
estava sentindo muito sua falta. Agora estou mais contente porque acabo de descobrir uma
coisa importante: preto é, apenas, a ausência do branco" (ZIRALDO, 1986, p.30).
Olha que interessante, Ziraldo: nós que  sabemos do racismo confesso de Lobato e
conseguimos vê-lo em sua obra, somos acusados por você de "macaquear" (olha o termo aí)
os Estados Unidos, vendo racismo em tudo. "Macaqueando" um pouco mais, será que eu
poderia também acusá-lo de estar "macaqueando" Lobato, em trechos como os citados
acima? Sem saber, é claro, mas como fruto da introjeção de um "processo" que ele provou
que "work" com grande eficiência e ao qual podemos estar todos sujeitos, depois de sermos
submetidos a ele na infância e crescermos em uma sociedade na qual não é combatido.
Afinal, há quem diga que não somos racistas. Que quem vê o racismo, na maioria os
negros, que o sofrem, estão apenas "macaqueando". Deveriam ficar calados e deixar dessa
bobagem. Deveriam se inspirar no menino  marrom e se resignarem. Como não fazem
muitos meninos e meninas pretos e marrons, aqueles que são a ausência do branco, que se
chateiam, que se ofendem, que sofrem preconceito nas ruas e nas escolas e ficam doídos,
pensando nisso o tempo inteiro, pensando tanto nisso que perdem a vontade de ir à escola,
começam a tirar notas baixas porque ficam matutando, ressentindo, a atenção guardadinha
lá debaixo da dor. E como chegam à conclusão de que aquilo não vai mudar, que não vão
dar em nada mesmo, que serão sempre pés-de-chinelo, saem por aí especializando-se na
arte de esperar pelo atropelamento de velhinhas.
Racismo é um dos principais fatores responsáveis pela limitada participação do negro no
sistema escolar, Ziraldo, porque desvia o foco, porque baixa a auto-estima, porque desvia o
foco das atividades, porque a criança fica o tempo todo tendo que pensar em como não
sofrer mais humilhações, e o material didático, em muitos casos, não facilita nada a vida
delas. E quando alguma dessas crianças encontra um jeito de fugir a esse destino, mesmo
que não tenha sido através da educação, fica insuportável e merece o linchamento público e
exemplar, como o sofrido por Wilson Simonal. Como exemplo, temos a sua opinião sobre
ele:  "Era tolo, se achava o rei da cocada  preta, coitado. E era mesmo. Era metido,
insuportável". Sabe, Ziraldo, é por causa da perpetuação de estereótipos como esses que às
vezes a gente nem percebe que eles estão ali, reproduzidos a partir de preconceitos
adquiridos na infância, que a SEPPIR pediu que o MEC reavaliasse a adoção de Caçadas
de Pedrinho. Não a censura, mas a reavaliação. Uma nota, talvez, para ser colocada junto
com as outras notas que já estão lá para proteger os direitos das onças de não serem caçadas
e o da ortografia, de evoluir. Já estão lá no livro essas duas notas e a SEPPIR pede mais
uma apenas, para que as crianças e os adolescentes sejam "colocados a salvo de tudo que é
violência e abuso", como está na cartilha que você ilustrou. Isso é um direito delas, como
seres humanos. É por isso que tem gente lutando, como você também já lutou por direitos
humanos e por reparação. É isso que a SEPPIR pede: reparação pelos danos causados pela
escravidão e pelo racismo.  Assim você se defendeu de quem o atacou na época em que conseguiu fazer valer os seus
direitos:  "(…) Espero apenas que os leitores (que o criticam) não tenham sua casa
invadida e, diante de seus filhos, sejam seqüestrados por componentes do exército
brasileiro pelo fato de exercerem o direito de emitir sua corajosa opinião a meu respeito,
eu, uma figura tão poderosa”. Ziraldo, você tem noção do que aconteceu com os, citando
Lobato, "negros da África, caçados a tiro e trazidos à força para a escravidão", e do que
acontece todos os dias com seus descendentes em um país que naturalizou e,
paradoxalmente, nega o seu racismo? De quantos já morreram e ainda morrem todos os
dias porque tem gente que não os leva a sério? Por causa do racismo é bem difícil que essa
gente fadada a ser pé-de-chinelo a vida inteira, essas pessoas dos subúrbios, que perpassam
todas as degenerescências, todas as formas e má-formas humanas – todas, menos a normal,
- porque nelas está a ausência do branco, esse povo todo representado pela mulata dócil que
você faz sorrir nos braços de um dos escritores mais racistas e perversos e interesseiros que
o Brasil já teve, aquele que soube como ninguém que um país (racista) também de faz de
homens e livros (racistas), por causa disso  tudo, Ziraldo, é que eu ia dizendo ser quase
impossível para essa gente marrom, herdeira dessa gente de cor que simboliza a angústia, a
solidão, a tristeza, gerar pessoas tão importantes quanto você, dignas da reparação (que nem
é financeira, no caso) que o Brasil também lhes deve: respeito. Respeito que precisou ser
ancorado em lei para que tivesse validade, e cuja aplicação você chama de censura.
Junto com outros grandes nomes da literatura infantil brasileira, como Ana Maria Machado
e  Ruth Rocha, você assinou uma carta que, em defesa de Lobato e contra a censura
inventada pela imprensa, diz: "Suas criações têm formado, ao longo dos anos, gerações e
gerações dos melhores escritores deste país que, a partir da leitura de suas obras, viram
despertar sua vocação e sentiram-se destinados, cada um a seu modo, a repetir seu
destino. (...) A maravilhosa obra de Monteiro Lobato faz parte do patrimônio cultural de
todos nós – crianças, adultos, alunos, professores – brasileiros de todos os credos e raças.
Nenhum de nós, nem os mais vividos, têm conhecimento de que os livros de Lobato nos
tenham tornado pessoas desagregadas, intolerantes ou racistas. Pelo contrário: com ele
aprendemos a amar imensamente este país e a alimentar esperança em seu futuro. Ela
inaugura, nos albores do século passado, nossa confiança nos destinos do Brasil e é um
dos pilares das nossas melhores  conquistas culturais e sociais." É isso. Nos livros de
Lobato está o racismo do racista, que ninguém vê, que vocês acham que não é problema,
que é alicerce, que é necessário à formação das nossas futuras gerações, do nosso futuro. E
é exatamente isso. Alicerce de uma sociedade que traz o racismo tão arraigado em sua
formação que não consegue manter a necessária distância do foco, a necessário distância
para enxergá-lo. Perpetuar isso parece ser patriótico, esse racismo que  "faz parte do
patrimônio cultural de todos nós – crianças, adultos, alunos, professores – brasileiros de
todos os credos e raças." Sabe o que Lobato disse em carta ao seu amigo Poti, nos albores
do século passado, em 1905? Ele chamava de patriota o brasileiro que se casasse com uma
italiana ou alemã, para apurar esse povo, para acabar com essa raça degenerada que você,
em sua ilustração, lhe entrega de braços abertos e sorridente.
Perpetuar isso parece alimentar posições de pessoas que, mesmo não sendo ou mesmo não
se achando racistas, não se percebem cometendo a atitude racista que você ilustrou tão
bem: entregar essas crianças negras nos braços de quem nem queria que elas nascessem. Cada um a seu modo, a repetir seu destino. Quem é poderoso, que cobre, muito bem
cobrado, seus direitos; quem não é, que sorria, entre na roda e aprenda a sambar.
Peguei-o para bode expiatório, Ziraldo? Sim, sempre tem que ter algum. E, sem ódio,
espero que você não queira que eu morra por  te criticar. Como faziam os racistas nos
tempos em quem ainda linchavam negros. Esses abusados que não mais se calam e apelam
para a lei ao serem chamados de "macaco", "carvão", "fedorento", "ladrão", "vagabundo",
"coisa", "burro", e que agora querem ser tratados como gente, no concerto dos povos. Esses
que, ao denunciarem e quererem se livrar do que lhes dói, tantos problemas criam aqui,
nesse país do futuro. Em uma matéria  do Correio Braziliense você disse que  "Os
americanos odeiam os negros, mas aqui nunca houve uma organização como a Ku Klux
Klan. No Brasil, onde branco rico entra, preto rico também entra. Pelé nunca foi alvo de
uma manifestação de ódio racial. O racismo  brasileiro é de outra natureza. Nós somos
afetuosos”. Se dependesse de Monteiro Lobato,  o Brasil teria tido sua Ku-Klux-Klan,
Ziraldo. Leia só o que ele disse em carta ao amigo Arthur Neiva, enviada de Nova Iorque
em 1928, querendo macaquear os brancos norte-americanos: "Diversos amigos me dizem:
Por que não escreve suas impressões? E eu  respondo: Porque é inútil e seria cair no
ridículo. Escrever é aparecer no tablado  de um circo muito mambembe, chamado
imprensa, e exibir-se diante de uma assistência de moleques feeble-minded e despidos da
menos noção de seriedade. Mulatada, em suma. País de mestiços onde o branco não tem
força para organizar uma Kux-Klan é país perdido para altos destinos. André Siegfred
resume numa frase as duas atitudes. "Nós defendemos o front da raça branca - diz o sul - e
é graças a nós que os Estados Unidos não se tornaram um segundo Brasil". Um dia se fará
justiça ao Kux-Klan; tivéssemos aí uma defesa dessa ordem, que mantém o negro no seu
lugar, e estaríamos hoje livres da peste da imprensa carioca - mulatinho fazendo o jogo do
galego, e sempre demolidor porque a mestiçagem do negro destroem (sic) a capacidade
construtiva." Fosse feita a vontade de Lobato, Ziraldo, talvez não tivéssemos a imprensa
carioca, talvez não tivéssemos você. Mas  temos, porque, como você também diz,  "o
racismo brasileiro é de outra  natureza. Nós somos afetuosos." Como, para acabar com a
polêmica, você nos ilustra com o desenho para o bloco quemerdense. Olho para o rosto
sorridente da mulata nos braços de Monteiro Lobato e quase posso ouvi-la dizer: "Só dói
quando eu rio".
Com pesar, e em retribuição ao seu afeto,
Ana Maria Gonçalves
Negra, escritora, autora de Um defeito de cor.